Logo a seguir temos uma entrevista com Nivaldo Cleto, contador, consultor e diretor de tecnologia & Negócios da Fenacon, sobre a implantação do projeto da e-NF mais conhecido como nota fiscal eletrônica.
A mesma põe um pouco de luz sobre o assunto, esclarece alguns princípios operacionais do modelo e relata sobre os paradigmas que devem ser quebrados para que o mesmo possa funcionar em sua plenitude.
1) Como é o atual sistema de emissão de documento fiscal no Brasil?
R : Podemos dizer que o atual sistema de emissão de documentos fiscais no Brasil é um sistema tradicional, mantido híbrido quando o modo envolve o preenchimento manual de notas fiscais em talões, ou através de sistemas mecanizados, onde ainda contamos com a tradicional máquina de escrever (apesar do estágio de aposentadoria), datilografando notas soltas , ou os formulários contínuos nos quais os sistemas de informação preenchem eletronicamente a nota fiscal concomitante com os lançamentos manuais ou integrados nos livros fiscais. Daqui para a frente, em plena era digital, temos o surgimento da Nota Fiscal Eletrônica, onde as empresas deixarão de utilizar o jurássico talonário de notas fiscais e suas cópias para migrar e fazer o registro da operação através do processamento eletrônico e online dos dados, o que vai significar que as empresas vão literalmente invadir os portais das autoridades tributárias municipais, estaduais e federais, homologando as operações em tempo real.
2) Quais as conseqüências que o atual modelo tributário traz para o Brasil?
R: O atual modelo tributário reflete um sistema extremamente burocrático que impõe aos empreendedores uma grande perda de tempo para atender as exigências das autoridades fiscais em suas milhares de normas e regulamentos. Isto na prática significa tirar do empresário grande parcela da dedicação que deveria ser colocada na sua atividade fim, que é a venda de mercadorias, produtos e serviços. É um verdadeiro entrave para o desenvolvimento do país comparado com os demais países nesse mundo integrado e globalizado. Sai governo, entra governo e o discurso é sempre o mesmo, vamos fazer uma reforma tributária, e na realidade o que ocorre são reformas arrecadatórias postas em prática através de aumentos na carga tributária, como foi o caso da majoração do PIS e COFINs quando os discursos na época falavam sobre mini-reforma tributária, e daí lá se vão os cidadãos a serem traídos mais uma vez.
3) Além da burocracia provocada, a área econômica também é afetada com o atual modelo?
R: Não resta a menor dúvida que a nossa economia é afetada com tanta burocracia, pois gera desinteresse e inibição para que o capital seja investido na atividade produtiva. Vejamos, como exemplo, o caso da demora para abertura de empresas no Brasil, cuja média é de 50 dias conforme pesquisa publicada na Revista Fenacon em Serviços do bimestre maio/junho de 2006. Quantos novos negócios podem deixar de se realizar quando se perdem tantos dias para iniciar um novo empreendimento?
4) Quais os objetivos do Projeto da Nota Fiscal Eletrônica?
R: É uma forma muito eficaz e quase perfeita para aperfeiçoar os controles fiscais, combater a sonegação e por conseguinte prover o aumento da arrecadação de tributos. Após o advento da certificação digital das assinaturas de empresas e pessoas, ganhou forma a idéia da implantação de um modelo nacional de documento fiscal eletrônico para substituir a tradicional sistemática de emissão em papel. A validade jurídica garantida pela assinatura digital do remetente ao emitir o documento fiscal, promoverá a integração dos sistemas de fiscalização nas três esferas de governo, federal, estaduais e, municipais, porque prevê-se a padronização, racionalização e compartilhamento das informações contábil e fiscal, assim como a integração de todo o processo relativo às notas fiscais.
5) Que benefícios a implantação da Nota Fiscal Eletrônica trará para o profissional contábil?
R : Com a integração dos sistemas utilizados para execução dos trabalhos na área fiscal , não haverá mais necessidade de lançar manualmente o conteúdo da nota fiscal, pois com a utilização do Código de Barras Bidimensional, o profissional importará os dados na Nota Fiscal Eletrônica com uma leitora ótica, agilizando o processamento das obrigações acessórias, reduzindo sensivelmente os erros com a escrituração das notas fiscais de forma manual. Haverá um sistema que fará a leitura online, via Web, da NF-e que será lançada para validar a operação. Portanto todos deverão estar conectados à Internet em tempo real. A implementação desses sistemas eletrônicos de recepção e envio de NF-e incentivará o uso de relacionamentos eletrônicos com clientes. Sinto-me à vontade para recomendar que as empresas e profissionais, procurem os desenvolvedores de sistemas para ajustar e integrar o lançamento das Notas Fiscais Eletrônicas. Posso afirmar que mais do que nunca, estará sacramentada, de forma eletrônica, com utilização da Certificação Digital, o elo mais importante da sociedade entre o fisco e o contribuinte, o “Moderno e Digital” Profissional da Contabilidade. A partir da implementação do projeto, não poderemos nos esquecer de dois fatores muito importantes no cotidiano do profissional contábil: em primeiro lugar vai trazer um grande e novo alento na diminuição da grande e atual burocracia , e, em paralelo, serão minimizados os grandes riscos que hoje a coletividade tem na correta apuração dos débitos tributários de seus clientes, tamanha é a quantidade de procedimentos a processar .
6) E para os contribuintes, quais serão os principais benefícios?
R: São fortes tanto no aspecto empresarial quanto de responsabilidades com as autoridades normativas. No campo fiscal teremos redução de custos com a dispensa de emissão e de armazenamento de documentos em papel, simplificação e padronização das obrigações acessórias e uniformização das informações enviadas às diversas unidades federadas, No aspecto empresarial o ganho será na redução do tempo de parada dos caminhões nos Postos Fiscais e Fronteiras, incentivo ao uso de relacionamentos eletrônicos com clientes e fornecedores (B2B – Business to Business) e a diminuição da desleal concorrência promovida pelos sonegadores.
7) O que falta para a implantação do Projeto da Nota Fiscal Eletrônica?
R: Num primeiro momento, até para dar credibilidade no projeto, o Projeto da Nota Fiscal Eletrônica já foi implantado em diversas empresas de grande porte como por exemplo Sadia, Souza Cruz, Gerdau, Petrobras, Kaiser, Ultragaz, Wickbold, Ford, Volkswagen, Telefônica e Eletropaulo. Portanto os profissionais receberão em breve os documentos eletrônicos denominados DANFE – Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica para lançar nos livros fiscais
8) Como será o modelo operacional da Nota Fiscal Eletrônica?
R: Vou responder passo a passo, conforme a comunicação cotidiana do contabilista, como funcionará o processo: O empresário gera a NFe através de um sistema que utiliza linguagem compatível com a Web, no caso XML. O responsável legal ou o procurador, valida a NFe com uma assinatura digital, nível de segurança A-3 (para isso utiliza por exemplo o e-CPF ou e-CNPJ). Em tempo real, a empresa envia através da Web os dados da NFe para o Servidor da Secretaria da Fazenda (SEFAZ de origem) validar e autorizar a emissão da NFe. A SEFAZ enviará através de email ou consulta no Portal um código de liberação dessa NFe. No momento em que a SEFAZ autoriza e emissão da NF-e, o contribuinte pode liberar o transporte da mercadoria ou produto, através da emissão de um Documento denominado DANFE – Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica. Esse documento fiscal será emitido em papel comum, em única via, que conterá impressa, em destaque, a chave de acesso para consulta da NF-e na Internet dentro de um Código de Barras bi-dimensional , que facilitará a consulta pelas unidades fiscais da SEFAZ e Receita Federal. O contribuinte (destinatário), não emissor de NF-e, ao receber o DANFE, poderá escriturar os dados nele contidos para a escrituração da NF-e, sendo que sua validade ficará vinculada à efetiva existência da NF-e nos arquivos das administrações tributárias envolvidas no processo, comprovada através da emissão da Autorização de Uso
As informações da NF-e ficarão armazenadas num Portal Nacional (WebService) denominado SPED – Sistema Público de Escrituração Digital, para consulta das partes envolvidas, bem como dos profissionais da contabilidade através de um aplicativo chamado de “Visualizador da NF-e” que já está disponível para download no seguinte endereço da Web
http://200.198.224.29/portal/visualizador/download.html
9) O que é DANFE? E para que ele serve?
R: O DANFE-Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica, não é uma nota fiscal, nem substitui uma nota fiscal, servindo para acompanhar a mercadoria da origem até o destino, sendo também um instrumento auxiliar para consulta da NF-e, pois contém a chave de acesso da NF-e, que permite ao detentor desse documento confirmar a efetiva existência da NF-e através do Ambiente Nacional ou site da SEFAZ na Internet.
10) Quais as principais dificuldades enfrentadas atualmente para a implantação da Nota Fiscal Eletrônica?
R: Entendo que será a difusão cultural para a quebra de tradicionais paradigmas, já que sairemos de uma geração onde a prova documental era o papel e de agora em diante serão os dados armazenados de forma segura, num DataCenter, com validade jurídica, tudo assinado com a Certificação Digital. Confesso que essa transição assusta os cidadãos, cria um certo desconforto porque o brasileiro é “colecionador de papel por excelência” e a falta de maiores conhecimentos da área de tecnologia acaba gerando o que chamamos de pânico digital. Recomendo que os Conselhos Regionais de Contabilidade CRCs em conjunto com os Sindicatos da Classe realizem um Programa Nacional de Inclusão Digital, levando o conhecimento da tecnologia da informação que será aplicada no dia a dia da profissão.
11) Como será a estratégia de implantação da Nota Fiscal Eletrônica?
R : O projeto da NF-e vem sendo desenvolvido em parceria com 19 empresas, que se habilitaram para participar do Piloto do projeto a partir do convite que foi formulado para diversas empresas.
Visando possibilitar uma adaptação gradativa dos contribuintes e da sociedade a este novo modelo, a NF-e será implantada em duas etapas:
Na primeira fase de implantação do projeto, prevista para ocorrer a partir de abril até julho 2006, dezenove empresas estarão emitindo NF-e que serão autorizadas por seis Secretarias de Fazenda (BA, SP, RS, SC, GO e MA). Nesta fase, as NF-e serão emitidas de forma simultânea às suas tradicionais notas fiscais em papel, modelo 1 e nesta fase as NF-e e respectivos DANFES não terão validade tributária. A partir de agosto/2006, será iniciada a segunda fase, onde será ampliada a quantidade de empresas e estados emissores da NF-e.
12) Quem são os principais idealizadores do Projeto da Nota Fiscal Eletrônica?
R : Receita Federal, Secretarias das Fazendas dos Estados e DF, Secretaria das Finanças dos Municípios e SUFRAMA – Superintendência da Zona Franca de Manaus. Todas as entidades firmaram um Protocolo no ENAT - Encontro Nacional de Administradores Tributários, em agosto de 2005. A supervisão desse projeto está a cargo da Receita Federal.
13) Existe mais alguma informação sobre a NOTA FISCAL ELETRÔNICA que julga importante ser divulgado para os CONTABILISTAS?
R: Paralelamente ao Projeto da Nota Fiscal Eletrônica, o governo está desenvolvendo o Projeto da Escrituração Fiscal Digital e Escrituração Contábil Digital, onde as empresas de grande porte, a princípio, enviarão para a Receita Federal todo o movimento fiscal e contábil de forma eletrônica. Vou resumir :
A empresa escritura as Notas Fiscais de Serviços no Portal da Nota Fiscal Eletrônica das Prefeituras,
As Notas Fiscais de Vendas de Mercadorias e Produtos, incluindo os itens das NFs de compra e vendas mais o Registro de Inventário são escrituradas e enviadas mensalmente para a SEFAZ (Validadores do SINTEGRA). Anualmente, após a escrituração dos Livros Diários Eletrônicos e respectivos livros auxiliares, os mesmos serão enviados para registro nas Juntas Comerciais de forma digital (CDs, DVDs, Pen-Drives), vide Instrução Normativa DNRC Nº 102, DE 25 DE ABRIL DE 2006, que cria a figura dos Livros Mercantis Eletrônicos.
Todas as informações eletrônicas serão enviadas pelos contribuintes e armazenadas num grande Banco de Dados, gerenciado pela Receita Federal e demais órgãos da administração tributária em todas as esferas
Uma vez implantado, esse projeto será um singular Caso de Sucesso para todos os governos do Mundo. Quando o processo estiver concluído, daqui a poucos anos, não há a menor dúvida que as autoridades tributárias terão um controle maior na arrecadação, combate à sonegação e crescimento expressivo do volume de tributos arrecadado. É um pressuposto muito importante para que a carga seja percentualmente reduzida já que na prática um número maior de empresas sairá das sombras da sonegação e pagará os impostos comuns a todos que exercem atividade empresarial.
Nivaldo Cleto - Contador
Sócio da Clássico Consultoria
Diretor de Tecnologia e Negócios da Fenacon
Membro do Comitê Gestor da Internet do Brasil - Suplente
www.nivaldocleto.cnt.br
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