Bruce Einhorn
22/01/2007
É o tipo de oportunidade pela qual a maioria das empresas iniciantes da internet morreria. A atriz de TV chinesa Zhang Yu disse que diretores conhecidos a haviam forçado a fazer o "teste do sofá" antes de lhe concederem papéis para representar. Para provar suas afirmações, Zhang colocou em novembro de 2006 vídeos de dois encontros num site da internet chamado Yoqoo, uma das dezenas de imitações chinesas do YouTube e do MySpace. Graças ao material picante - que foi bastante editado para que não resvalasse para o pornográfico - o tráfego no Yoqoo triplicou para cerca de 7,5 milhões de visualizações por dia.
Mas, na China, o Yoqoo teve pouca chance de aproveitar essa publicidade. Pouco depois que o vídeo foi disponibilizado, o site - que se pronuncia "yo ku" e significa "bom" e "legal" em chinês - recebeu uma discreta mas dura advertência das autoridades do governo que policiam a internet. "As autoridades relevantes disseram que o assunto recebeu tanta atenção da mídia pública que seria bom para nós remover os vídeos", diz Victor Koo, fundador do Yoqoo. Embora insista que "não havia nada de pornográfico" no conteúdo, Koo rapidamente obedeceu.
O episódio mostra as possibilidades e os perigos do conteúdo gerado pelo usuário e das redes de socialização na China: você pode conseguir um tráfego monstruoso com o vídeo certo, mas pode ter problemas por mostrá-lo. Mesmo assim, a China continental continua sendo um terreno fértil para as empresas iniciantes da chamada internet 2.0. O país possui mais de 130 milhões de usuários da internet, um crescimento de 30% em 2006. Para atendê-los, a China vem estimulando o surgimento de companhias domésticas com esperanças de se tornarem os próximos MySpace, YouTube ou Digg. Logo, elas estarão lado a lado com a maioral. O MySpace da News Corp. está negociando a criação de uma versão em mandarim do fenômeno das redes de socialização. E o Google está assumindo uma participação no site de compartilhamento de vídeos Xunlei.
Adolescentes e jovens chineses, criados sob o cardápio ameno preparado pela mídia estatal, estão correndo para esses sites. "Existe uma energia reprimida", diz Eric Feng, fundador da Mojiti, uma companhia iniciante de Pequim que permite aos usuários acrescentar textos, gráficos e vídeos. "Eles querem se expressar, mas possuem poucos lugares para fazer isso", diz Feng. Esse desejo de auto-afirmação está na origem da explosão dos sites especializados no compartilhamento de música, vídeos, fotografias e textos.
Os investidores americanos também gostam desses sites. A General Atlantic de Greenwich, Connecticut, investiu em março US$ 48 milhões na Oak Pacific Interactive, uma companhia de Pequim que opera o Mop.com, a mais popular rede de socialização pela internet da China. O Qihoo, especializado na busca de blogs, recebeu em novembro US$ 25 milhões da Sequóia Capital, Redpoint Ventures e Highland Capital Management.
Um grande motivo desse interesse: as companhias iniciantes da chamada Web 2.0 não precisam gastar muito dinheiro para desenvolver conteúdo caro que depois é pirateado, afirma Bill Tai, sócio da Charles River Ventures na Califórnia, que apóia a WangYou, uma empresa iniciante de Pequim. "Não existe tecnologia própria", diz Tai. "Isso está mudando o perfil de risco de uma maneira positiva."
Mas, conforme os habitantes locais e os estrangeiros estão rapidamente aprendendo, ainda há muitos riscos para as operações da Web 2.0 na China. Nos EUA, um vídeo inadequado pode enfurecer alguns pais e grupos religiosos; na China, um vídeo muito mais brando pode levar os censores a fechar sua companhia. O YouTube monitora os vídeos em busca de pornografia e violações da propriedade intelectual, mas na China a auto-censura vai mais longe. Por exemplo, a WangYou recebe cerca de 6 mil arquivos de vídeo por dia, e a companhia não pode permitir que nenhum deles seja disponibilizado ao público antes de checá-los.
Assim como outras companhias, a WangYou possui vários artifícios para manter a paz com as autoridades chinesas. Os usuários precisam obedecer as regras, o que inclui a proibição de material pornográfico e propaganda contra o governo. Uma equipe de cerca de duas dezenas de censores internos assiste vídeos 24 horas por dia, sete dias por semana, e os usuários que chamam atenção para vídeos problemáticos colocados na rede são recompensados com pontos que podem ser trocados por produtos.
Um fã do WangYou é Li Mengyang, de 28 anos. Produtor de uma estação de TV de Pequim, Li já lançou na rede 200 de suas próprias músicas, além de alguns vídeos de curta duração. Li diz estar contente com a filtragem de material considerado tabu. Ele acrescenta que apesar da censura, existe mais liberdade on-line do que em seu trabalho diário na TV, "onde idéias criativas simplesmente não vão adiante" porque os chefes têm medo de ofender telespectadores conservadores.
Manter os censores satisfeitos é relativamente fácil; encontrar uma maneira de fazer dinheiro é mais difícil. O mercado publicitário on-line da China deverá movimentar um total de apenas US$ 800 milhões em 2007, em comparação aos cerca de US$ 19 bilhões dos EUA. Para aumentar as receitas, o site de compartilhamento de vídeos Mofile.com está desenvolvendo um programa que poderá transmitir recomendações de vídeo - e comerciais - com base em escolhas anteriores dos usuários. "Poderemos descobrir que tipo de comercial de TV interessa a você", afirma o fundador Andy Fan. A Mofile tem cerca de 6 milhões de usuários registrados e mostra cerca de 4 mil vídeos por dia.
Outros sites estão tentado se conectar aos 400 milhões de usuários de telefones celulares da China. O WangYou, por exemplo, deixa as pessoas enviarem fotografias de suas páginas na internet para telefones celulares e recebe um abatimento na tarifa de ligação da companhia telefônica. Como a China possui mais assinantes de telefones celulares do que internautas, os sites que se voltam para os usuários de PCs podem sair perdendo para companhias que deram mais duro nas redes de socialização através do celular.
Apesar dos bolsos fundos da News Corp., a controladora do MySpace, executivos chineses da internet afirmam não estar muito preocupados com sua chegada. Afinal de contas, as companhias americanas da internet não estão se saindo particularmente bem na China. Yahoo, Amazon.com e Google vêm sendo suplantadas por concorrentes locais, e o eBay anunciou em dezembro que iria fechar seu site chinês e formar uma joint venture com a Tom Online de Pequim. Em razão desse histórico, e do potencial de erros no trato com os censores, os grupos locais podem muito bem estar em vantagem, afirma Joseph Chen, diretor-presidente da Oak Pacific, que controla seis sites da Web 2.0. O que faz Chen perder o sono à noite não são os pensamentos sobre os saqueadores americanos, e sim as hordas sempre crescentes de concorrentes locais. (Com Olga Kharif, de Portland, EUA)Data: 15/03/2007