Criminalidade económica 2008-01-16 00:05
No ano passado, 80% dos crimes económicos investigados pela judiciária corresponderam a fraude fiscal.
Susana Represas
Em 2007, mais de 80% dos crimes económicos investigados pela Polícia Judiciária tinham por base suspeitas de fraude fiscal. De um total de 345 investigações na área da criminalidade económico-financeira, 278 referem-se à alegada prática de fraude e evasão fiscal, contra apenas 5 investigações baseadas em suspeitas de corrupção.
Os dados do relatório anual da Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária, a que o Diário Económico teve acesso, mostram ainda que o depósito num banco, em dinheiro, é a operação financeira com maior número de suspeitas de crime. De seguida surgem as transferências bancárias, nacionais e estrangeiras.
A coordenadora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, nota que “há ainda muita fraude fiscal”, o que, diz a responsável pela investigação da Operação Furacão, “traduz a fraca censura social em relação à fraude fiscal”. A magistrada rejeita, por isso, que seja um problema de norma. Ao Diário Económico argumenta que “a lei que temos é adequada”.
Por outro lado, Cândida Almeida não tem dúvidas de que “já se começa a sentir a injustiça, uns pagam impostos, outros fogem ao fisco”, o que tem conduzido a um aumento das denúncias. E, claro, “as autoridades estão mais alerta para estes crimes que afectam estruturalmente o Estado democrático de direito”, conclui.
As comunicações estão, aliás, em destaque no relatório anual da Judiciária. Ao longo do ano passado deram entrada nos departamentos da PJ cerca de 13 mil informações sobre operações financeiras, mas apenas em 724 casos existe uma suspeita de crime. Ou seja, em cada 100 possíveis suspeitas, apenas seis justificam a abertura de um inquérito crime. As comunicações são essencialmente feitas por entidades financeiras e seguradoras, sendo a Inspecção-geral dos Jogos é a entidade com maior número de informações enviadas à Unidade de Informação Financeira.
PJ congelou 32 milhões
No ano passado, a Polícia Judiciária suspendeu bens de valor superior a 32 milhões de euros, que corresponde à investigação de 14 casos. As suspensões são decretadas quando as autoridades têm suspeitas sobre a origem do dinheiro em causa. Se o processo for arquivado, o dinheiro fica disponível.
O combate à criminalidade económico-financeira, sobretudo fraude fiscal, é uma das prioridades deste Governo, em matéria de investigação.
Para o juiz desembargador Rui Rangel, isto acontece porque o Estado definiu a prioridade política com um fim económico: “O Estado despertou para este fenómeno e está interessado em recolher elevados valores financeiros”. São fonte de receita.
“Há uma maior consciência contra a fraude”
A Coordenadora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) considera que “o elevado número de crimes de fraude e evasão fiscal está relacionado com o facto de haver uma cultura de não censura ética e social face a este tipo de crimes”. A análise de Cândida Almeida é complementada com outro dado: “As autoridades estão a responder com mais consciência e estão mais alertadas para esta criminalidade”. Os dados da Polícia Judiciária dão conta de um elevado numero de investigações sobre crimes de fraude e evasão fiscal, crimes que, de acordo com esta magistrada, “abalam o Estado Social e originam graves injustiças”. A opinião é partilhada pelo advogado Germano Marques da Silva, que, também em declarações ao Diário Económico, não tem dúvidas de que “cometem-se menos crimes” de fraude e evasão fiscal, até porque, diz o advogado, “os serviços estão a funcionar melhor e detectam mais processos” com suspeitas de irregularidades. Mas também se trata de uma questão de mentalidades, porque “a sociedade está a mudar”. O presidente da Assembleia Geral do BCP contesta que haja uma agressividade do Estado, mas sublinha que estes dados “mostram que a reforma tributária de 2000 começa agora a produzir efeitos”, o que conduz a mais processos.
“Estado viola direitos dos contribuintes”
”Exagera-se nos louvores à administração fiscal”, garante o fiscalista da sociedade de advogados Miranda Correia Amendoeira, Samuel Fernandes de Almeida. Em declarações ao Diário Económico, o advogado considera que “Portugal passou de uma administração fiscal em que o grau de eficiência era quase nulo, para uma máquina em condições de cruzar informações e fazer um trabalho minimamente decente”. Mas mesmo assim, Fernandes de Almeida afirma que “continuam a fazer-se muitos disparates”, muitas vezes em prejuízo “do próprio Estado, que em alguns casos não cobra por desconhecimento”, mas também em casos nos quais o contribuinte acaba por sair penalizado. A administração fiscal, conclui o advogado especialista em fisco, “está a abusar e a violar os direitos dos contribuintes, por exemplo ao nível das penhoras”. O juiz desembargador Rui Rangel também alerta para um eventual abuso por parte do Estado, que, garante, “tem cometido algumas ilegalidades”. Rangel dá um exemplo: “Por vezes são feitas apreensões superiores aos valores em dívida” sem que haja a rapidez necessária na devolução das verbas aos contribuintes que provem não estar em falta nos seus deveres para com o fisco.
Outros destaques
- Em 2007 a Policia Judiciária enviou 206 pedidos de informação ao estrangeiro e recebeu 104. Espanha foi o país mais requisitado por Portugal para pedidos de informação.
- A Bélgica está no topo da lista dos países que enviaram pedidos à autoridades nacionais.
- De um total de 32 milhões de euros em bens congelados, metade são apreensões em dólares. Seguido de euros e libras.
- Depois da fraude fiscal, o maior número
Data: 16/01/2008