Os processos de inquérito de criminalidade sexual contra menores são na sua grande maioria arquivados. Isto é, os suspeitos de pedofilia nunca chegam a enfrentar a barra dos tribunais. Em 2007, dos 188 processos concluídos no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), em Lisboa, foi deduzida acusação em 10,6 por cento dos inquéritos. Os restantes 89,4 por cento foram arquivados. Maria José Morgado explicou ao PortugalDiário as causas de arquivamento.
Os dados fazem parte do relatório do Grupo de Prevenção do Abuso e do Comércio Sexual de Crianças Institucionalizadas criado pelo Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, dirigido pela procuradora-geral adjunta Maria José Morgado, e traduzem a actividade penal da 2ª secção de processos no DIAP de Lisboa.
Em 2007, foi deduzida a acusação em 20 inquéritos e ordenado o arquivamento em 168. Ou seja, apesar das várias denúncias, o Ministério Público só concluiu existirem indícios fortes contra os suspeitos em duas dezenas de casos, no distrito de Lisboa. Uma realidade que se confirma na análise dos últimos seis anos da acção penal do DIAP.
De 2001 a 2007, este departamento deduziu acusação em 203 processos contra o arquivamento em 906 inquéritos. Ou seja, em seis anos, no distrito de Lisboa, o Ministério Público arquivou 81,7 por cento dos processos de criminalidade sexual contra menores e deduziu acusação em 18,3 por centos dos casos.
Falsas denúncias e aumento da visibilidade
Maria José Morgado, responsável há um ano por este departamento, explicou em declarações ao PortugalDiário a realidade por detrás dos números. A responsável garante que a taxa portuguesa está «dentro da média europeia» e não é inferior às taxas de acusação existentes em outros países da Europa.
A dificuldade de prova é uma realidade com a qual a justiça se debate e neste caso concreto a procuradora-geral adjunta explica que «há factores muito variados» que conduzem ao arquivamento. «Até há pouco tempo havia a possibilidade de desistência da queixa, o que contribuía para o arquivamento», adiantou Maria José Morgado, que se referia à entrada em vigor da nova lei penal que determinou o carácter público dos crimes sexuais contra menores, ou seja, o Estado tem a obrigação de investigar mesmo que os queixosos desistam da denúncia.
Outra das razões apontada para o arquivamento são as «falsas denúncias», motivadas muitas vezes por casos de conflitos familiares e divórcios, e que levam à denúncia de abusos sexuais que na realidade não existem. «A detecção destes casos é a prova de que a justiça está a funcionar», explicou a procuradora, adiantando que o boom de denúncias no seguimento do processo Casa Pia levou a uma «visibilidade do crime», o que conduziu a que muitas situações que não são abusos fossem denunciadas. «Por vezes pensamos que estamos perante um abuso e na realidade não estamos», referiu.
«Boa taxa de condenação»
No entanto, há casos «em que há a certeza de que aquela criança foi vítima de uma abuso sexual e não é possível chegar ao actor material ou à prova material do crime. São crimes de intimidade, muitas vezes é a palavra da criança contra a do adulto», explicou a procuradora.
Maria José Morgado salienta que o importante é chegar à «verdade material» e que há uma «boa taxa de eficácia na 2ª secção do DIAP», realçando que a «taxa de condenação [nestes crimes] é acima dos 90 por cento, o que significa que o que sai do DIAP é bem fundamentado», esclareceu.
Data: 22/04/2008