Dom José Luiz Azcona ajuda CPI a investigar casos de pedofilia na ilha
O bispo da Prelazia do Marajó, dom José Luiz Azcona, foi ouvido na última quinta-feira por integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga os casos de pedofilia no Brasil. Presidida pelo senador Magno Malta, a CPI é formada também por representantes do Ministério Público Federal (MPF), que assessoram os parlamentares, além de agentes da Polícia Federal. Para o grupo, o bispo repetiu as denúncias feitas no mês passado sobre a rede de tráfico de seres humanos, pedofilia e exploração sexual de menores que atua no Arquipélago do Marajó. Dom Azcona relatou os casos mais emblemáticos acompanhados pela população e pela Igreja, práticas que contam, algumas vezes, com a participação de representantes do 'poder local', como ele se refere a políticos que estariam envolvidos com os crimes.
Dom Azcona, juntamente com outros dois bispos, dom Flávio Giovenale, da Diocese de Abaetetuba, e dom Erwin Krautler, da Prelazia do Xingu, estariam na linha de tiro desses grupos por conta das denúncias que vêm fazendo, que também incluem tráfico de drogas, grilagem de terras e desmatamento ilegal no Pará. Mesmo assim, ele dispensou a proteção policial e, além das informações, se colocou à disposição da CPI para ajudar as investigações. Segundo informações de membros da CPI que estiveram no Pará, os três bispos foram convidados a participar, no dia 6 de maio, de uma audiência pública sobre o assunto na Comissão da Amazônia, Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados.
Em entrevista por telefone à repórter Marly Quadros, de O LIBERAL, dom Azcona, que no próximo dia 4 de maio vai completar 21 anos à frente da Prelazia do Marajó, falou da sua impressão sobre a visita da CPI da Pedofilia, sobre a certeza de que os problemas enfrentados pelo povo de Marajó não estão isolados no arquipélago e sobre a esperança de que após as denúncias, a realidade mude na região. Veja a seguir:
Depois de suas denúncias, algum representante do poder público o procurou para pedir mais informações?
Não. O que eu penso é que o governo está diante de uma situação grave. Temos lido que há 300 pessoas ameaçadas de morte no Pará. Se entendi bem, estão com segurança, com escolta. Mas um Estado, onde 300 pessoas estão ameaçadas de morte e não se procura investigar a origem das ameaças, mostra que algo grave está acontecendo. Eu creio que não é questão só deste governo. A problemática está se alastrando faz tempo. Mas agora se vê com visibilidade que a situação fugiu do controle.
Além do senhor outras pessoas estão ameaçadas no Marajó?
Não por conta dessas denúncias. Existem temores entre os sindicalistas, por conta dos agravantes. Focalizando a nossa sociedade paraense e marajoara percebe-se que há uma expansão desse tipo de atividade, sobretudo de exploração sexual no Pará.
Como essas denúncias chegam até a Igreja?
Por conhecimento da realidade, o contato direto com o povo. E não é só aqui no Marajó. O mesmo está acontecendo em várias outras cidades. Em Santarém, Bragança, Abaetetuba, Cametá, Belém, Marajó, Altamira, Xingu... No Pará, existe esta problemática que está se expandindo cada vez mais. Isso é um fato que se agrava.
A Igreja chegou a fazer um levantamento preciso desses casos de exploração sexual de crianças, do tráfico de mulheres e da violência?
Vai ser muito difícil fazer. Mas sabemos pelos casos que são acompanhados por catequistas, pessoas responsáveis da comunidade e pelos próprios Conselhos Tutelares. Ouvimos muitos casos da população que está aflita com a situação.
Como foi a sua conversa com os integrantes da CPI da Pedofilia?
Senti uma sintonia deles com a defesa dos direitos da criança, da pessoa humana. Há uma vontade sincera de atuar no caso. O que foi tratado é que, junto com a generalização que se fez na comissão, de que não é só problema do Marajó, do Pará, mas um problema de todo o Brasil, se precisa do testemunho de coragem do cidadão para atuar nesta luta. Eles repetiram isso, que também não é uma questão só do Pará.
O que o senhor relatou?
O que já se tornou conhecido em 2006, 2007, quando o corredor do tráfico humano até a Guiana se tornou notícia em todo o País. E citei aquele outro caso de exploração sexual de menores em Portel, que já faz dois anos. Nem comentamos o que é mais antigo, o caso do Tajapuru, onde crianças se prostituem por um quilo de carne e um litro de óleo.
Como o senhor disse, essas denúncias são antigas. Já houve alguma resposta do poder público a esses problemas?
Com relação a este fato vergonhoso do Tajapuru não me consta nem um tipo de atividade. Com relação ao caso de Portel, se começou um processo, mas é lento. E com relação ao tráfico humano para a Guiana Francesa, são informações que estão com a Comissão de Direitos Humanos de Brasília. As respostas demoram, ainda mais tratando-se de uma problemática de tanta abrangência. Os esforços que se fazem no Judiciário são uma parte do trabalho. Mas não é só com polícia e juiz que se vai resolver tudo. Precisamos de uma transformação de toda a sociedade, em todos os âmbitos. O próprio Papa (Bento XVI) já disse que quando a comodidade física está por cima da verdade e da Justiça vigora a lei do mais forte, da morte e da injustiça. Por isso, o Papa e os bispos do Brasil conclamam o povo para que assuma a sua responsabilidade ética. Que renuncie a Satanás e a cultura de morte.
Data: 29/04/2008