Os clones estão à solta. Da comunidade Orkut ao celular, do cartão bancário ao telefone fixo, as "cópias" se multiplicam, trazendo prejuízos e dores de cabeça. Pouco a pouco, os clones se transformam no mal do século 21.
Saques indevidos no banco, contas telefônicas com valores estratosféricos e, na internet, xingamentos e situações constrangedoras. Esses são alguns dos problemas de quem tem seus dados pessoais interceptados por pessoas inescrupulosas e, assim, acaba por ganhar um "sósia."
No campo da telefonia, por exemplo, o atual campeão de clonagem é o celular, segundo a fundação Pro Teste, que defende os direitos do consumidor. Nesse caso, os criminosos passam a receber as chamadas destinadas ao telefone das vítimas. Além disso, todas as ligações que o criminoso fizer serão cobradas na conta telefônica do clonado.
Mas outra modalidade que está em ascensão, segundo o Procon-SP, é a clonagem de telefones fixos, que, igualmente à de celular, traz a conta das ligações para a vítima. "Hoje, há um mercado negro de telefones fixos e celulares clonados, que é coordenado por quadrilhas especializadas", explica o delegado Paul Henry Verduraz, do Setor de Investigações Gerais (SIG) de São Bernardo do Campo.
Mas as clonagens não param na telefonia. Outro delito que está se tornando comum é o de copiar cartões bancários. Para tanto, o esquema se utiliza de um arsenal tecnológico. São câmeras instaladas em caixas eletrônicos, máquinas falsas para transações com cartão e sites que capturam senhas. O prejuízo fica sempre com a vítima.
"Os casos de clonagem de cartões estão aumentando", diz Kássia Correa, presidente da Associação Nacional dos Usuários de Cartão de Crédito (Anucc). Por lá, em um ano, o número de reclamações de usuários que sofreram o golpe cresceu 15 vezes.
Além dos cartões, a internet também foi eleita como alvo pelos clones. E, por lá, eles têm endereço certo: o Orkut. A parte mais evidente disso são os perfis falsos de celebridades. Sílvio Santos, por exemplo, tem 40. A Xuxa, conta com 27. O presidente Lula, 78.
E o que, a princípio, parece uma brincadeira de fãs, no fim, pode acabar trazendo problemas ao clonado. "Fiquei paranóico quando descobri que tinha um clone", diz o diretor de teatro Gerald Thomas. "Ele se fazia passar por mim, fazia comentários e, até, dava dicas sobre teatro."
Thomas chegou até a processar o Google – dono do Orkut –, mas não obteve resposta. "Mas , depois disso, o cara que me clonou me mandou um e-mail pedindo desculpas e deletou o perfil falso."
Essa sorte não teve o apresentador Sérgio Mallandro. Atualmente, ele possui 24 perfis falsos na comunidade virtual. "Até acho que seja uma homenagem dos fãs", diz ele. "Mas o que me preocupa é que esses clonadores estão enganando o meu público, pois não sou eu quem responde as mensagens que me mandam."
Os famosos, entretanto, não são o alvo principal de clonagens no site de relacionamentos. Segundo Márcio Fonseca, presidente da ONG The Web Justice, "90% dos casos são de vinganças pessoais, com a criação de páginas falsas com conteúdo ofensivo e fotos comprometedoras."
O universitário Bruno de Souza Gama, 22 anos, foi vítima de um caso do tipo. "Criaram um perfil falso dizendo que eu era gay." E, a partir daí, segundo ele, a página passou a ser usada para distribuir ofensas. "Se fazendo passar por mim, o cara xingava meus amigos e procurava travestis para insultar."
Gama suspeita que o autor do clone seja algum conhecido. Isso porque a página continha fotos que não estavam publicadas no perfil verdadeiro do universitário. "Não sei como ele conseguiu essas imagens." Por sorte – e depois de insistentes denúncias ao site – o perfil falso acabou sendo deletado pelo Orkut.
Problemas como esse, segundo Fonseca, da The Web Justice, são decorrentes da facilidade em se criar um perfil falso . "O site não exige nenhuma comprovação de identidade na hora de criar um perfil." Assim, para clonar, basta criar uma conta nova e incluir informações e fotos copiadas de um perfil verdadeiro.
"Por isso, as pessoas devem colocar o mínimo de informações necessárias no site", diz o promotor do Ministério Público de São Paulo, Augusto Rossini, especializado em crimes de internet. "Também é recomendável não publicar fotos", diz.
Segundo o promotor, clonar um perfil no Orkut é crime de falsidade ideológica (pode dar até um ano de cadeia). Já se o clonador insultar a vítima, pode também ser enquadrado no crime de injúria e difamação (com mais 6 meses de reclusão.). "Mas, como o Google – dono do Orkut – não colabora com as investigações da polícia brasileira, dificilmente o crime é desvendado."
Procurado pela reportagem, o Google, via Assessoria de Imprensa, declarou que: "O Orkut dispõe de ferramentas no serviço para inibir que membros pratiquem atividades ou conteúdos ilegais. Nossa equipe de suporte examina essas reclamações e toma as medidas necessárias."
Cartão bancário é alvo mais visado por larápios
No mundo dos clones, os cartões bancários são um dos alvos mais visados. "O golpe com cartões bancários é, de longe, a forma mais rentável de clonagem", afirma o perito da Polícia Federal, Paulo Quintiliano. "O criminoso consegue o dinheiro na hora."
Exatamente por isso os larápios não economizam esforços. E colocam em ação um verdadeiro arsenal hi-tech: câmeras escondidas em caixas eletrônicos, máquinas falsas para transações com cartões e sites imitando as páginas de bancos na internet.
Segundo a Associação Nacional de Usuários de Cartão de Crédito, o número de cartões de crédito e de débito clonados está aumentando. "Em 2004 recebíamos 40 reclamações por mês. Hoje, recebemos 600", diz a presidente da entidade, Kássia Correa.
E, no mesmo ritmo, cresce também a quantidade de tecnologias que permitem efetuar os golpes. "Quando se desenvolve um dispositivo de segurança para o cartão, os criminosos sempre encontram uma forma de burlá-lo", diz a diretora de Risco da administradora de cartões Visa, Izabel Silva.
Atualmente, os golpistas agem em quadrilhas organizadas. Cada um dos membros fica responsável por uma das etapas da clonagem, como contactar comerciantes, confeccionar cartões e sacar o dinheiro no caixa.
Nas lojas, eles implantam máquinas falsas de pagamento. "Quando o cliente passa o seu cartão para pagar as compras, o equipamento capta a senha e as informações bancárias", diz Quintiliano.
Já em caixas eletrônicos, quem saca dinheiro não pode dar bobeira "Já houve casos em que criminosos instalaram câmeras nas agências bancárias e gravaram dados do cliente", diz Izabel, da Visa.
A internet também é outro meio de clonagem. "Os criminosos usam phishing scams - e-mails que induzem o internauta a informar os dados financeiros em páginas falsas", explica Quintiliano.
Depois de clonar um cartão, os golpistas fazem compras em shoppings e sacam dinheiro em caixas eletrônicos. E o prejuízo, como sempre, sobra para as vítimas.
A engenheira civil Virgínia Rodrigues, 40 anos, teve R$ 25 mil subtraídos de sua conta bancária no fim do ano passado. "Com um cartão clonado, fizeram saques da poupança e do limite de cheque especial."
Virgínia foi ressarcida pelo banco. Mas isso demorou 20 dias. "Depois do ocorrido, mudei de banco. Não me sentia mais segura."
Segundo Izabel, da Visa, para se ter menos riscos de ser clonado, é recomendável nunca perder de vista o cartão durante as compras, não aceitar ajuda de terceiros em caixas eletrônicos e, na internet, colocar os dados financeiros apenas em sites conceituados.
Data: 15/08/2008 09:13:44