Pedro Doria*
Na última segunda-feira, cá esta coluna questionou a segurança da urna eletrônica. Nunca na história deste espaço – se sua Excelência o presidente permite o plágio –, houve tanto e-mail de resposta, além dos comentários no site do Link. A coluna apanhou tanto quanto foi aplaudida. Vale retornar ao assunto.
No site, um leitor classificou o texto de ofensivo aos profissionais de informática do país. Perdoe, mas não é o caso. Algumas das questões que circularam por aqui foram repassadas, diretamente, por pessoas talentosas que estiveram efetivamente envolvidas no projeto inicial da eleição digital e que, portanto, conhecem por dentro as fragilidades do sistema.
Outra das críticas afirma que a urna é segura, sim, porque não passa de uma calculadora – e não há, no mundo, calculadora à qual dados dois e dois some cinco.
A questão não é tão simples. Para que aconteça fraude eleitoral, é preciso que gente envolvida no processo aja de má fé. Gente atua com má fé, nestes casos, ou porque recebeu por isto, ou porque ideologicamente quer mudar o resultado. Se houver um único corrupto envolvido no carregamento de dados da urna, alguns votos podem ser adicionados; o software pode ser modificado para subtrair um percentual determinado de votos de um candidato para creditá-los a outro.
A maneira mais simples e eficaz de fraudar, no entanto, não é na urna e sim nas centrais dos TREs, onde os votos vão sendo computados. Juízes eleitorais têm senhas que os permitem expurgar votos quando há algum tipo de erro de leitura dos discos. É normal. Mas há casos testemunhados por fiscais de partidos, em eleições passadas, nos quais estas senhas aparecem coladas em post-its nos monitores das máquinas nas mãos de vários operadores. É que às vezes os juízes têm medo de computador. Na confusão, não é impossível que apenas uma destas pessoas insira os dados que quiser.
Mas no fim não passa de uma questão de princípio. Eleição é coisa séria demais para que dependamos apenas de confiar no que dizem as autoridades. O sistema da urna é fechado e secreto. Assim, ninguém independente pode conferir o software para dizer que ele está livre de erros ou bugs. O argumento do TSE é de que conhecer o programa na intimidade facilitaria o trabalho de hackers. Talvez. O que a experiência do software livre diz, no entanto, é que quanto mais gente tem acesso ao código, mas eficaz fica o programa.
Há uma solução simples para tudo isto. Ela tem a ver com o princípio mais básico de uma democracia, que é o da recontagem. Na dúvida a respeito do resultado de uma eleição, reconta-se. Foi esta recontagem que Al Gore não conseguiu, nos EUA, em 2000. A recontagem elimina qualquer fraude.
Para que uma recontagem seja possível, na eleição digital, é preciso que toda urna eletrônica imprima um boleto com o voto do eleitor. Ele lê, confere, deposita numa urna comum. Se houve dúvida quanto ao resultado da eleição naquela zona eleitoral, conta-se de novo. Se ninguém tiver dúvida, ótimo.
Alguns podem argumentar que perde a graça - a eficiência, afinal, está na rapidez do resultado. Recontagens infinitas atrasariam o resultado de uma eleição. Só que é o raciocínio errado: recontagens só são necessárias quando o resultado é apertado e, ainda assim, apenas em locais específicos. E eficiência, em democracia, não se mede pela rapidez. Mede-se pela certeza de que cada voto foi contado corretamente.